Esquecido na China

A combinação Brasil-Bósnia fez sucesso no Wolfsburg

A combinação Brasil-Bósnia fez sucesso no Wolfsburg

Há pouco mais de quatro anos, o modesto Wolfsburg surpreendia a Europa toda ao desbancar o Bayern de Munique, de Jürgen Klinsmann, e ficar com o inédito título alemão. Mais do que o caneco erguido, a equipe comandada pelo durão Félix Magath mostrava um jogo bom de ver, com uma impiedosa dupla de ataque formada por Grafite e Edin Džeko. Juntos, o brasileiro e o bósnio marcaram 54 dos 80 gols dos Lobos naquela temporada do Campeonato Alemão, ou seja, 67,5% dos tentos do time e mais gols do que 11 equipes do torneio.

Mas havia uma fonte de abastecimento a essa dupla e essa fonte se chamava Zvjezdan Misimović. O conterrâneo de Džeko vestia a camisa 10 e era um meia clássico, de toque refinado, muita categoria e que distribuía diversos passes para gol. Somente naquela temporada, o bósnio deu incríveis 20 assistências, líder no quesito com cinco passes há mais que o segundo colocado do ranking, Mesut Özil, defendendo o Werder Bremen na época.

Daquele trio, era a dupla oriunda da Bósnia que aparentava ter maior futuro. Grafite, que foi o grande nome da conquista, não era nenhum garoto e já provara no Brasil que era, no máximo, um bom centroavante. Džeko tinha apenas 23 anos e Misimović era quatro anos mais velho e tinham o diferencial por serem presenças constantes na seleção nacional.

O brasileiro, como esperado, não ficou por muito tempo no Wolfsburg e partiu pro Oriente Médio com a intenção de fazer uma gordurinha na conta bancária. Džeko seguiu mais um ano e meio nos Lobos, mas depois viu a lógica que muitos apontavam se concretizar e foi para a Inglaterra. Ele está no Manchester City, onde vive relação de amor e ódio com a torcida e não repete as atuações tão elogiadas na Alemanha.

E Misimović? Esse sumiu. Dos três, era ele quem eu mais nutria esperanças de ver explodir num futuro próximo, mas a sempre furada ganância do Wolfsburg o tirou do clube. Em 2010, o clube alemão arrancou Diego da Juventus e o bósnio, sem espaço, foi despachado para a Turquia, onde defendeu o Galatasaray.

Como azar pouco é bobagem, ninguém se deu bem na história. Os Lobos se salvaram do rebaixamento apenas na última rodada; Diego decepcionou e ainda arrumou briga com Félix Magath (que chegou no meio da temporada para evitar o descenso); e o bósnio fez apenas nove partidas com a camisa do clube turco.

Hoje, Misimovic faz sucesso na China

Hoje, Misimovic faz sucesso na China

Aos 31 anos, Misimović já começa a dar sinais de que sua carreira está por terminar. Após um ano no Dynamo Moscou, o bósnio passou a defender o Guizhou Renhe, da China, em 2013. Há quase dez meses na Ásia, ele tem mostrado do que é capaz, balançando as redes quatro vezes e dando nove passes para gol. Seu time é o quarto colocado da Liga Chinesa e briga por uma das três vagas na AFC Champions League.

Não imaginava que fosse ter um futuro assim, esperava muito mais dele, mas o direcionamento de sua carreira não esteve nem perto do ideal. Para o homem das 20 assistências no único título nacional do Wolfsburg, isso é muito pouco. Espero que faça mais sucesso na China e que siga mostrando aos senhores de olhos puxados o futebol clássico e objetivo que conquistou tantos admiradores na Alemanha. Mesmo que isso seja obtido, ainda será pouco, principalmente porque não foi valorizado pelo clube que tanto ajudou há quatro anos.

Guardiola amansou o Bayern

Apesar dos bons resultados, o Bayern não está jogando bem (Foto: AFP)

Apesar dos bons resultados, o Bayern não está jogando bem
(Foto: AFP)

Quando o Bayern de Munique anunciou que Josep Guardiola seria seu técnico nesta temporada, logo surgiu um ponto de interrogação em minha cabeça: Pep será capaz de domar esse time de estilo totalmente diferente do Barcelona de seus tempos? Na época, não me atrevi a responder e, hoje, não só digo que domou o Bayern como destaco que ele amansou o time bávaro.

Sim, sei que é apenas começo de temporada e que os resultados de Guardiola não estão nem perto de serem ruins, mas o futebol apresentado deixa a torcida com uma pulga atrás da orelha.

O Bayern de Jupp Heynckes e também de Louis van Gaal (que tem méritos na montagem do time campeão de tudo na temporada passada e ninguém lembra) não só tinha a tradicional posse de bola esmagadora, como trucidava seus adversários. Os bávaros não tinham pudor algum em enfiar seis, sete ou oito gols em seus rivais, era um time pra lá de envolvente.

O trabalho de van Gaal foi assim e Heynckes apenas aprimorou, dando um jeito na defesa, que era o grande ponto fraco da época do holandês, dando mais troca de posições ao ataque e mostrando que era possível vencer dosando um pouco do ritmo, apesar das várias goleadas em seu período como técnico.

Em contrapartida, o trabalho de Guardiola vem tendo uma única semelhança com o de seu antecessor: as vitórias. O futebol apresentado, que era o mais aguardado por todos, não tem feito o exigente torcedor bávaro abrir um enorme sorriso de orelha a orelha.

O toque de bola vertical e objetivo, que sufocava os adversários, foi substituído por passes maçantes e preguiçosos, a maioria de lado, e as constantes trocas de posições dos homens de frente estão sendo modificadas por invenções (‘pardalices’?) de Guardiola na escalação.

A começar pelo posicionamento de Thomas Müller. A joia bávara sempre foi homem de chegada ao ataque, seja pelo lado do campo ou atuando atrás do centroavante. Pep já o escalou como um dos jogadores que formava um tripé no meio-campo, absurdamente distante da área. Por Müller não ter um físico que lhe proporcione força para combater e armar com mesma eficiência, Guardiola mostra-se equivocado com esta alteração.

Lahm virou volante com Guardiola (Foto: Bundesliga)

Lahm virou volante com Guardiola
(Foto: Bundesliga)

Mas, sem dúvida alguma, a decisão mais questionável, é a escalação de Phillip Lahm como volante. Posso estar falando uma besteira do tamanho do planeta, mas Lahm nunca será um cabeça-de-área e não digo isso pelas apresentações iniciais do capitão bávaro, mas sim de suas características. Ele é um dos poucos (senão único) laterais-direito completos, atacando e defendendo com maestria, mas nunca foi um exímio passador. Enquanto lateral, suas participações com passes eram quando vinha de trás, com espaço e sendo elemento surpresa. No meio-campo raras vezes terá esse espaço e ainda precisa ser ágil na hora de receber e soltar a bola.

Ao deslocar Lahm pro meio e ainda escalar o mediano Rafinha na lateral-direita, Guardiola simplesmente abre mão de ter um lateral completo para ter um jogador que mostra enormes dificuldades em trabalhar fora de posição.

E isso não é cisma minha. Os números mostram como o Bayern já começa a entrar em outro ritmo.

A vitória por 3-1 sobre o Borussia Mönchengladbach, na estreia, foi a melhor atuação bávara nas estatísticas, com 26 finalizações e 92% de acerto nos passes, apesar da posse de bola de apenas 60%. Contra o Nürnberg, na terceira rodada, bons dados também: 26 chutes, 90% de acerto nos passes e 81% de posse de bola.

Desde então, os números destoam. Contra Eintracht Frankfurt (2ª rodada), Freiburg (4ª) e Hannover (5ª), os bávaros não chegaram à marca de 20 finalizações, além de terem posse de bola inferior a 75%.

Pode parecer heresia questionar números assim, mas vale ressaltar que, na temporada passada, o Bayern tinha 15 pontos de 15 disputados, além de 17 gols marcados e dois sofridos em cinco rodadas. Hoje são 13 pontos e os mesmos dois tentos sofridos, mas apenas nove marcados, o que registra um pouco da sonolência bávara.

Em defesa de Guardiola, deve-se comentar que ele não chegou à Baviera para dar sequência ao trabalho de Heynckes, mas sim para criar uma nova cena no clube, com novas ideias e um novo estilo de jogo. Mas é importante ressaltar que revolucionar é diferente de inventar e o que o técnico espanhol tem feito em alguns jogos desta temporada não é nada revolucionário.

É início de trabalho, é verdade, mas não existe nenhuma lei que nos proíba de criticá-lo. É apontando os erros no princípio que a história se conserta mais para frente e se antes eu não sabia se Pep poderia domar o Bayern, hoje me pergunto se aquele time brilhante de meses atrás pode reaparecer.

Hamburg: andando na contramão

Hamburg contrata muito e vê poucos resultados dentro de campo

Hamburg contrata muito e vê poucos resultados dentro de campo

O dia 25 de maio de 1983 entrou para a história do Hamburg SV e também do futebol alemão. O clube do norte derrotou a Juventus pelo marcador mínimo, gol de Félix Magath, e sagrou-se campeão europeu pela primeira vez, tornando-se também o segundo clube do país a obter tal feito. A conquista também era uma forma de recuperar-se após a perda do caneco em 1980 quando o campeão foi o Nottingham Forest.

A equipe treinada pelo lendário Ernst Happel tinha tudo para se tornar uma das grandes potências da Alemanha daquele momento em diante. Nos seis anos do austríaco no comando técnico, além do título europeu, o HSV foi bicampeão alemão em 82 e 83 e ficou outras duas vezes na segunda colocação.

Porém, desde que Happel deixou o clube em 1987, o Hamburg só voltou a aparecer nas três primeiras posições da Bundesliga na temporada 1999/00, quando acabou em terceiro lugar, atrás de Bayern e Leverkusen, mas muito distante da briga pelo título. Aliás, título esse que nunca mais veio, vale ressaltar.

O curioso da situação do Hamburg é que o clube nunca passou por efeitos como os de Köln, Borussia Mönchengladbach, Nürnberg e outros campeões nacionais que em alguns momentos foram clubes “ioiô”. Os dinossauros nunca caíram para a segunda divisão (único time alemão a disputar todas as temporadas da Bundesliga), por consequência, nunca sofreram com graves problemas financeiros ou algo do tipo. É um clube, de certa forma, estável, por isso a estranheza desse atual momento.

Se não bastassem apenas os resultados inexpressivos em âmbito nacional, o Hamburg também não segue a linha da maioria dos clubes do país. Dortmund, Bayern, Leverkusen, Bremen (apesar de este também viver fase horrorosa), Schalke e muitos outros observam o mercado alemão e de países emergentes, gastam pouco e ainda formam jogadores com a intenção de utilizá-los com frequência no time principal e não para vendê-los antes mesmo de chegarem à equipe de cima. O HSV não faz nada disso, aliás, faz o contrário.

Berg foi uma tremenda decepção no Hamburg

Berg foi uma tremenda decepção no Hamburg

Desde a temporada 2008/09, quando caiu para o rival do norte, Werder Bremen, na semifinal da Copa da Uefa, o Hamburg tem contratado de montão, inclusive, trazendo jogadores de renome internacional como Ruud van Nistelrooy e Zé Roberto, além de jovens promessas por altos valores, como o sueco Marcus Berg, artilheiro da Eurocopa Sub-21 de 2009, comprado por 10 milhões de euros.

O auge das contratações foi a temporada 2011/12 quando Frank Arnesen assumiu a direção de esportes do clube. O dinamarquês trabalhou por cinco anos no inglês Chelsea e montou uma filial do time londrino na Alemanha. Em seu primeiro ano, o diretor trouxe cinco jogadores oriundos dos Blues e, de todos eles, apenas o turco Gökhan Töre rendeu, não à toa, foi vendido no ano seguinte para o Rubin Kazan da Rússia.

Para a última temporada, Arnesen acertou a mão ao contratar menos e fazer investimentos cirúrgicos como trazer de volta o ídolo Rafael van der Vaart, resgatar a carreira do goleiro René Adler e surpreender com o volante Milan Badelj e com o centroavante Artjoms Rudnevs. Ainda assim, o desempenho na Bundesliga foi abaixo do esperado e o Hamburg, na 7ª colocação, ficou novamente fora das competições internacionais.

Para a próxima temporada, o clube do norte decidiu mudar. Frank Arnesen deixou a barca e Oliver Kreuzer assumiu a direção de esportes. O alemão de 47 anos jogou no Bayern de Munique por seis temporadas nos anos 90 e já está há mais de uma década trabalhando na parte administrativa do futebol. Sua última experiência foi no Karlsruhe, por onde ficou duas temporadas.

A meta de Kreuzer é diminuir a alta folha salarial do clube. Hoje, ela gira em torno de 50 milhões de euros e a ideia é deixa-la abaixo dos 40 milhões. Para alcançar tal objetivo, o destaque do time, Heung-Min Son, foi vendido por 10 milhões ao Bayer Leverkusen e o flop Marcus Berg (terceira maior contratação da história do clube e autor de míseros cinco gols em menos de 50 jogos) também deixará o clube em direção do Panathinaikos.

Apesar dessa filosofia “pé no chão”, o Hamburg parece continuar com a sina de jogar dinheiro fora. Para tomar de exemplo, o reforço mais recente foi o zagueiro Johan Djourou. O francês já era um fracasso no Arsenal e passou seis meses terríveis jogando no Hannover. Apesar de o investimento ter sido barato (750 mil euros), o retorno dentro de campo não parece que será dos maiores.

Em decadência na carreira, o veterano Roque Santa-Cruz também esteve próximo de acertar com o clube. Kreuzer o contatou, mas a mulher do paraguaio não queria morar em Hamburg e o jogador recusou a transferência.

A janela de negociações foi aberta há pouco tempo, isso significa que ainda poderemos ver outras bizarrices no clube do norte. E é assim que o HSV, andando na contramão do futebol germânico, vai se esforçando para manter o status de único clube que disputou todas as edições da Bundesliga.

Imagens: UEFA