O conceito das funções do centroavante foi mudando ao longo dos anos. Na época em que os times atuavam mais espaçados no gramado, os técnicos se davam ao luxo de deixa-los isolados na frente, aguardando uma mísera bola para empurrar para as redes e correr para o abraço.
Hoje, não ter um centroavante com capacidade de abrir espaços e participar mais ativamente da partida significa, na maior parte das vezes, jogar com um a menos.
“Na maior parte das vezes”. Como tudo no futebol, isso não é regra.
Na França temos dois exemplos de times que não seguem bem essa tendência, possuem centroavantes, digamos, à moda antiga, mas que, dentro de seus contextos, fazem temporadas dignas e apresentam ao país nomes de centroavantes que podem ajudar em ocasiões específicas.

Santini encontrou em Rodelin o parceiro ideal | Foto: SM Caen/Site oficial
Um desses caras é Ivan Santini, do Caen. Nascido na antiga Iugoslávia, o croata de 28 anos está desde 2016 na França e, pela segunda temporada consecutiva, está entregando um número razoável de gols.
No primeiro ano foram 15 em 34 jogos (2.888 minutos, ou seja, um gol a cada dois jogos e 12 minutos). Na atual temporada, os números estão um pouco abaixo: 11 gols em 30 partidas (2.598 minutos, ou um gol a cada dois jogos em 56 minutos).
Santini marcou todos os 11 gols de dentro da grande área, sendo que cinco foram de pênalti, três com apenas um toque (todos de cabeça), dois precisaram de dois (um foi quase embaixo do gol) e apenas um foi mais trabalhado.
Parte desse rendimento vem, é claro, do modelo de jogo do time e das características dos atletas que rodeiam Santini. Um deles é Ronny Rodelin. Jogador que prometia muito quando surgiu no Nantes, mas que pouco rendeu no Lille, ele está na terceira temporada no Caen e conseguiu dobrar o número de assistências: de três para seis. Quatro desses passes para gol foram para o goleador croata.
Santini está longe de ser o atacante mais virtuoso entre os times pequenos da Ligue 1 e dificilmente será a solução para um clube maior, mas graças a ele o Caen chega nas rodadas finais três pontos longe da zona de playoff do rebaixamento. Não tem como não creditar a ele esses méritos, afinal de contas, quase metade dos gols do time no campeonato (46,1%) tiveram participação dele (contabilizando a única assistência que deu na temporada).
O argentino dos Canários
Outro “empurrador de bolas pras redes” de sucesso nesta temporada é o argentino Emiliano Sala. Tratado com muito afeto no Bordeaux, clube onde chegou em 2010, foi agora no Nantes que, enfim, explodiu na primeira divisão. Já são 12 gols (mesma quantidade da temporada anterior) e quatro assistências. Num time com míseros 33 gols marcados – o terceiro pior ataque da Ligue 1 – Sala é responsável por 48,3% dos tentos, seja com passes ou assistências.
O mais interessante dos gols do argentino é o nível de decisão. Sala balançou as redes em cinco vitórias por 1 a 0, em um triunfo por 2 a 1, em dois empates por 1 a 1 e duas vezes num empate por 2 a 2. Dos 46 pontos dos Canários, 21 podem ser colocados na conta do argentino.
Assim como o já citado Santini, Sala também vive de marcar com toques únicos. Quatro dos 12 gols foram de pênalti, seis precisaram de um contato com a bola, um precisou de dois e ainda houve um sem querer, onde a zaga chutou a bola em cima dele e entrou.

Quase metade dos gols do Nantes tiveram participação de Sala | Foto: FC Nantes/Site oficial
Os números de Sala talvez só não sejam melhores porque a queda do Nantes em 2018 é algo extremamente preocupante. O time comandando por Claudio Ranieri não vence desde a 29ª rodada (dia do último gol do argentino) e ficou com diminutas chances de disputar a próxima Liga Europa.
Ainda assim, inegavelmente é a melhor fase da carreira de Sala, que dificilmente continuará no Nantes. Na janela de inverno foi cortejado por Wolverhampton, Brighton e pelo chinês Beijing Renhe. Apesar da seca de gols desde março, deverá buscar voos maiores.
Sala, assim como Santini, provam que podem ser opções interessantes para times de médio porte, especialmente aqueles que não prezam tanto por um jogo de maior posse de bola e que não se preocupam em ter um homem de frente apenas para empurrar a bola para as redes.
É a Ligue 1 provando, pela enésima vez, que há material humano de qualidades e características diferentes em todos os times. Sala e Santini são dois entre tantos exemplos. Basta garimpar.