O gigante tcheco

Quarentão, Koller já salvou o Dortmund evitando gols(Foto: Getty Images)

Quarentão, Koller já salvou o Dortmund evitando gols
(Foto: Getty Images)

No dia 30 de março de 1973, nascia em Smetanova Lhota, na antiga Tchecoslováquia, um dos personagens mais marcantes do futebol europeu nas últimas décadas: Jan Koller. Com seus dois metros e dois de altura e sua reluzente careca, era impossível assistir um jogo de seu time e não nota-lo em campo.

Em sua extensa carreira, foram mais de 550 jogos como profissional e 279 gols, sendo 55 deles pela seleção tcheca, que defendeu entre 1999 e 2009. Esses números colocam Koller como artilheiro máximo de seu país, empatado em quantidade de partidas com Pavel Nedvěd.

Porém, uma das histórias mais marcantes de sua carreira não envolveu nenhum gol marcado e sim alguns evitados.

Essa história aconteceu em novembro de 2002. Na época, Koller, já campeão alemão pelo Borussia Dortmund na temporada anterior, carregava parte da simpatia do torcedor por seus 11 importantes gols no ano do título. Essa afeição dos fãs com o tcheco aumentou na ocasião que citarei nos parágrafos seguintes.

O Borussia Dortmund foi ao estádio Olímpico de Munique encarar o Bayern em jogo válido pela 12ª rodada da Bundesliga. Os dois times estavam próximos na tabela de classificação e qualquer deslize já poderia traçar o destino de ambos no torneio, apesar do princípio de campeonato. Até por isso, a partida foi tensa, principalmente no lado borussiano. Seis cartões amarelos foram distribuídos pelo árbitro Michael Weiner, cinco deles para o Dortmund.

Tal postura emocional estava justificada pela maneira com o qual o jogo se desenrolou. Koller abriu o placar na etapa inicial, aproveitando passe do brasileiro Amoroso, porém, o BvB foi para o intervalo sem Frings, expulso por ter recebido dois cartões amarelos. O Bayern se aproveitou e com vinte minutos no segundo tempo já havia virado a partida.

No gol da virada, a revolta dos jogadores do Dortmund com um possível impedimento de Claudio Pizarro foi tão grande que Jens Lehmann se exaltou, conseguindo ser expulso e deixando seu time em situação delicada, pois Mathias Sammer havia efetuado sua terceira alteração dois minutos antes.

Sobrou para o gigantão Jan Koller. Quando surgiu na República Tcheca, ele era goleiro, mas ao chegar às categorias de base do Sparta Praga, virou atacante. Nada poderia ser mais estarrecedor para o torcedor do Borussia Dortmund: seu time perdia por 2×1, via seu goleiro ser expulso e passaria pelo drama de ter um centroavante de mais de dois metros defendendo sua meta por vinte minutos.

O que deveria ser o apocalipse para o Dortmund, acabou sendo um dos episódios mais insólitos da história do clube. Koller não só assumiu a bronca como foi bem de goleiro. Além de não sofrer gols, o tcheco mostrou qualidade na saída da meta – não era pra menos, com mais de dois metros – e ainda agarrou um potente tiro de Michel Ballack no último lance do jogo. Koller até tentou marcar um gol de cabeça no fim da partida, mas não foi capaz de evitar a derrota. Ao menos evitou o alargamento do marcador…

A conceituada revista Kicker valorizou tanto a atuação do tcheco que o colocou como “homem do jogo”.

Após deixar o Dortmund em 2006, depois de 73 gols em mais de 160 partidas, o tcheco se aventurou em outros países, como França e Rússia e até mesmo na Baviera, jogando pelo Nürnberg, mas não pôde vencer as lesões. Em 2011, jogando pelo Cannes na 3ª divisão francesa, o atacante encerrou seus 17 anos de carreira.

Fica registrada nossa homenagem ao novo quarentão, Jan Koller, o gigante tcheco!

Faltou sorte

Reus no banco: erro ou azar de Klopp?(Getty Images)

Reus no banco: erro ou azar de Klopp?
(Getty Images)

Nas duas derrotas para o Schalke 04 na atual temporada do Campeonato Alemão, o técnico do Borussia Dortmund, Jürgen Klopp, tomou decisões controversas. No primeiro turno, o atual bicampeão nacional veio a campo com três zagueiros e perdeu em casa por 2×1. Mais recentemente, no duelo realizado neste sábado (09), Klopp decidiu deixar Marco Reus, principal contratação do time na temporada, no banco de reservas e viu sua equipe ser novamente derrotada pelo mesmo placar do turno inicial.

A diferença entre as duas decisões de Klopp está na intenção do técnico, por isso, considero que ele errou no primeiro turno, mas levou azar no segundo.

No duelo realizado no Signal Iduna Park, a ideia do 3-5-2 foi totalmente descabida. Jürgen Klopp tentou utilizar um esquema que não havia usado antes, a não ser em jogos que partiu para o desespero e que a organização não valia muita coisa. Em um confronto importante e na época em que o campeonato poderia ficar aberto, ousar dessa maneira foi um erro brutal, afinal, utilizar três zagueiros era uma opção sem fundamento.

Já no duelo mais recente, Klopp tinha uma ideia fundamentada para colocar Reus no banco e iniciar a partida com Kevin Grosskreutz entre os titulares: neutralizar o lado direito do Schalke 04. Os Azuis Reais vinham motivados desde o empate com o Galatasaray pela UEFA Champions League, resultado que deu um gás para o time, além disso, jogavam em casa e partiriam para cima. Logicamente, o Schalke usaria seu lado mais forte, que é o direito de Farfán e do ofensivo lateral Uchida. A entrada de Grosskreutz era para brecar essas ações ofensivas e ajudar Schmelzer na marcação. Isso sempre foi normal, o que espantou foi a saída de Reus e não a de Kuba, que era mais rotineiro.

Obviamente, a entrada de Grosskreutz daria um decréscimo ofensivo, técnico e criativo ao Borussia Dortmund, mas acrescentaria na defesa. Convenhamos, para quem tem Gündoğan, Götze, Kuba e Lewandowski no ataque, um reforço na marcação em troca de força ofensiva não seria uma perda tão sentida.

Porém, o que vimos em campo foi uma superioridade do Schalke, jogando por terra a mexida de Klopp. Farfán e Uchida ‘engoliram’ Schmelzer e Grosskreutz, não à toa, a jogada dos dois gols saíram no setor da dupla amarela. Na volta do intervalo, Klopp se viu obrigado a mexer no time e sacou Grosskreutz e Hummels – que fez outra partida ruim, mostrando estar com forma física ruim – colocando Reus e Şahin. O BvB melhorou em campo e foi superior na etapa final, mas não significa nada se levarmos pro campo da especulação de um possível início nesse sistema tático.

A estratégia inicial foi boa? Sim. Era a ideal? Há controvérsias. O fato é que o Schalke jogou melhor e soube explorar as deficiências do Borussia Dortmund, como a exposição dos zagueiros – impressionante como Bender tem jogado mal – e, claro, a já citada atuação ruim de Grosskreutz e Schmelzer.

É possível que Jürgen Klopp chame para si a responsabilidade, tome a culpa pela derrota e coloque a superioridade azul em cima da mexida que fez, mas eu não o crucifico. A entrada de Reus desde o início não significa que o resultado positivo viria, mas a sua ausência era bem fundamentada. O fato é que no primeiro turno, Klopp inventou e errou feio, neste sábado não foi invenção, mas algo premeditado. Levou azar, acontece, não o crucifico como no primeiro turno.

O Mago da Floresta Negra

Christian Streich mudou a visão em cima do Freiburg(Getty Images)

Christian Streich mudou a visão em cima do Freiburg
(Getty Images)

Por mais de quinze anos, o Freiburg conviveu com um técnico que tinha grande identificação com o time e a torcida, Volker Finke. Foram 16 anos com Finke no comando técnico, saindo da terceira divisão, chegando à elite do futebol alemão e dando breves passadas pela Copa da UEFA – sendo que em 2002, deu trabalho ao futuro campeão Feyenoord – em menos de dez anos. Finke nunca se abalou com um resultado ruim, não à toa, caiu três vezes e subiu mais duas pelo Freiburg. É uma lenda no clube.

Em 2007, Volker Finke entregou o bastão para Robin Dutt, que assim como seu antecessor, levou o Freiburg para a primeira divisão e ainda quase chegou a Liga Europa em sua primeira temporada na elite do país. Dutt topou o desafio de assumir o Leverkusen e o sucessor foi Marcus Sorg, que estava no time sub-17 do Freiburg.

Diferentemente de seus antecessores, Sorg não teve vida fácil e durou apenas um turno no clube, largando o Freiburg em situação delicada na tabela da Bundesliga. Após mais de duas décadas sem demitir técnicos, o clube da Floresta Negra “provou” desse gostinho ao mandar Sorg embora.

Christian Streich, que era assistente de Dutt e também de Sorg, chegou para apagar um incêndio maior do que o imaginado. Semanas após assumir o comando do time, Streich teve uma péssima notícia: Papiss Demba Cissé, um dos poucos, senão único jogador que se salvava em todo elenco do Freiburg, foi vendido para o Newcastle e disputaria a Premier League. Na época, cheguei a comentar que esse foi o atestado de óbito do Freiburg. Mero engano! O “mago” Streich surpreendeu a todos.

O Freiburg fez uma impensável reconstrução de seu elenco na metade da temporada. Oito jogadores chegaram e outros oito deixaram o clube antes do início do segundo turno. Entre os contratados da época, veio Fallou Diagne, zagueiro de 23 anos. O senegalês tomou conta da zaga, antes, muito vasada do Freiburg e é, até hoje, uma das peças de confiança de Streich.

As diversas mudanças em si foram apostas de alto risco e com grande chance de dar errado, mas o pequeno percentual que dava vantagem ao clube da Floresta Negra prevaleceu e o clube teve a sétima melhor campanha do segundo turno, encerrando a Bundesliga em 12º e sem grandes sustos.

Para essa temporada, pouca coisa mudou. O Freiburg seguiu investindo pouco e apostando na juventude de seu elenco. Streich, que ficou conhecido por lapidar atletas como Dennis Aogo, Jonathan Pitroipa, Daniel Schwaab e o ótimo Oliver Baumann ainda na base, tem o segundo time mais jovem da Bundesliga – atrás apenas do Werder Bremen – com 24,2 de média de idade. Entre todos os atletas que entraram em campo com a camisa do Freiburg, onze estão abaixo dos 23 anos.

Schmid é um dos grandes nomes do Freiburg na temporada(Getty Images)

Schmid é um dos grandes nomes do Freiburg na temporada
(Getty Images)

Entre a garotada, dois nomes chamam a atenção: o já citado Oliver Baumann, goleiro titular do Freiburg desde a temporada 2010/11, quando tinha apenas 20 anos, e Jonathan Schmid, meia-atacante franco-austríaco que se tornou titular absoluto desde a chegada de Streich ao clube. Os dois, ao lado de Max Kruse – outro jovem destaque, mas criado no Werder Bremen – e Oliver Sorg – esse sim criado no Freiburg – são os jogadores com maior número de atuações pelo clube na Bundesliga.

Aliás, já que citei Baumann, vale dizer que ele é o jogador mais caro do clube, tendo um valor de mercado de cinco milhões de euros*. Para tomar de exemplo, dez jogadores do Bayern valem menos que isso, porém, são atletas que quase nem jogam ou que acabaram de subir para o time profissional. Isso dá uma dimensão de quão grande é o feito de Streich, que com um elenco barato e pouco badalado, está brigando por vaga nas competições internacionais.

Outro mérito de treinador é saber trabalhar a cabeça do jovem elenco. O natural seria que o time se vislumbrasse com o atual momento e começasse a planejar voos mais altos, quem sabe uma vaga na UEFA Champions League ou o título da Copa da Alemanha – o Freiburg é semifinalista –, mas o próprio técnico deu entrevistas recentes dizendo que pouco se importa com uma disputa internacional e que mais uma temporada na elite do futebol do país seria de bom grado.

Pés no chão: essa é uma das grandes mágicas de Streich. Boa parte do elenco trabalha com ele desde os anos finais da última década e são atletas que já criaram até mesmo vínculos emocionais pelo largo tempo de convivência. Em partes, seu trabalho lembra muito o de Jürgen Klopp no Borussia Dortmund, aonde chegou sem rumo, fez uma “limpa”, puxou garotos da base e fez um bom serviço de garimpagem de talentos em outras equipes, formando uma base sólida e, no caso borussiano, vencedora.

Não podemos deixar de mencionar a estabilidade interna que os treinadores que por lá passam, recebem. Durante 37 anos, Achim Stocker foi o presidente do Freiburg, se tornando o profissional mais duradouro no citado cargo em toda história do futebol alemão profissional. Ele foi o responsável pela vinda de Volker Finke e também pela passagem de bastão a Robin Dutt. Já falecido, Stocker não pôde ver seu pupilo Fritz Keller, vice-presidente no princípio dos anos 90, trazer Christian Streich para uma situação emergencial e ditar novos caminhos para o clube.

A confiança do elenco com Streich é mútua e o carisma do treinador é gigantesco. Esses fatores trazidos pelo Mago da Floresta Negra podem fazer com que o Freiburg chegue longe nos próximos anos, sempre responsabilizando Christian Streich, o homem que caiu de paraquedas no clube, mas com a consciência de onde e como pousar, para levantar logo e seguir em frente. Esse é o Mago da Floresta Negra.

*Dados obtidos no site http://transfermarkt.de/