400 vezes Hilton

Hilton é o brasileiro com mais jogos na história do Campeonato Francês | Foto: Divulgação/MHSC

Ao pisar no gramado do Estádio de La Mosson na tarde do último sábado (4), no empate por 1 a 1 entre Montpellier e Amiens, Vitorino Hilton entrou para a história. Aos 40 anos, o zagueiro chegou a expressiva marca de 400 jogos na carreira no Campeonato Francês. Entre todos os brasileiros que já disputaram o torneio, ninguém tem mais aparições do que ele.

Desconhecido no Brasil, o brasiliense, de 40 anos – jogador mais velho da atual temporada da Ligue 1 – tem carreira sólida na França. Filho de mãe costureira e pai trabalhador de construção, Hilton passou pela base da Chapecoense, mas se profissionalizou pelo Paraná Clube, antes de passar três anos no Servette, da Suíça, entre 2001 e 2004. Por lá, trabalhou com o técnico Lucien Favre, hoje no Nice, e participou da melhor campanha europeia do clube, parando nas oitavas-de-final da Copa da Uefa de 2002.

Desembarcou em terras gaulesas na temporada 2003/04, quando tinha 25 anos, para defender o Bastia. A passagem, que seria apenas por empréstimo, ficou para a eternidade. Suas qualidades nas antecipações, recuperação de bola e visão de jogo chamaram a atenção no curto período em que ficou na Ilha de Córsega e, na temporada seguinte, foi contratado em definitivo pelo tradicionalíssimo Lens.

Lens foi o segundo clube de Hilton na França | Foto: Reprodução

A mudança de clube significava o primeiro dos saltos que daria dali em diante. Em 2004, enquanto o Bastia escapou do rebaixamento somente na última rodada, o Lens foi o 8º colocado e havia disputado a Liga dos Campeões na temporada anterior.

No Norte da França, foi titular por quatro temporadas e se tornou capitão rapidamente. Anos depois, em 2013, em entrevista ao Eurosport, disse ter vivido os melhores anos da carreira no clube e que, na França, não há torcida mais apaixonada que a do Lens. “Meu único arrependimento foi não ter ganhado nada no clube”, admitiu.

O destaque foi tanto que entrou na seleção da temporada 2007/08, elaborada pela União Nacional dos Futebolistas Profissionais (UNFP), mesmo tendo sido o ano em que o clube Sangue e Ouro foi rebaixado para a segunda divisão.

Com a queda, abriu-se caminho para o Olympique de Marseille, de Didier Deschamps, e logo Hilton foi contratado por um dos mais tradicionais clubes franceses – o único do país a conquistar a Liga dos Campeões.

No OM, a primeira temporada foi brilhante. Participou de 36 dos 38 jogos do campeonato, e novamente foi colocado na seleção da temporada da UNFP. Em 2009/10, sem ter a mesma regularidade de antes, foi campeão francês e da Copa da Liga pelo Marseille, quebrando uma seca de quase 20 anos sem qualquer título.

No OM, Hilton foi campeão francês | Foto: Divulgação/OM.net

Porém, a saída do OM foi turbulenta. Assaltantes invadiram a residência do atleta, o agrediram e apontaram uma arma para sua cabeça diante dos próprios filhos. Após escapar desse episódio que poderia ter consequências ainda piores, o reflexo parecia único: sair do clube.

Foi aí que surgiu o Montpellier na vida de Hilton, em 2010/11. No ano seguinte, formando uma sólida dupla de zaga com o jovem Mapou Yanga-Mbiwa, conquistou o inédito título nacional, batendo o já milionário Paris Saint-Germain. Na mesma temporada, novamente foi lembrado na seleção da temporada da UNFP.

Considerado um profissional exemplar, dentro e fora de campo, Vito é capitão do time desde 2012, quando Mbiwa deixou o clube para se aventurar no futebol inglês. Desde então, tem sido líder e extremamente regular. Apenas na temporada passada fez menos de 30 jogos – ficou perto, 27.

Até o fim do campeonato, Hilton deve quebrar recordes de outros jogadores históricos como, por exemplo, Ludovic Giuly (401 jogos), Jean Tigana (411) e Dominique Rocheteau (417).

Hoje, sem dúvida alguma, é idolatrado pelo torcedor. Um exemplo foi relatado pela RFI Brasil, em maio deste ano. “Ao final do apito da partida em que o Montpellier perdeu de 2 a 0 para o Paris Saint-Germain, pela 34ª rodada do Campeonato Francês, Hilton chamou seus companheiros para agradecer a presença de um grupo pequeno de torcedores acomodados na lateral do estádio Parc des Princes reservada à torcida adversária. Apenas um jogador seguiu o gesto elegante do capitão da equipe. ‘Essa é a imagem que um jogador tem que deixar aos seus torcedores. Eles fazem um esforço de viajar até Paris, e o mínimo que devemos fazer é agradecer a presença deles’, explicou na entrevista na saída do estádio”.

Aos 40 anos, Vito é idolatrado no Montpellier | Foto: MHSC

Na mesma entrevista, Hilton foi sincero e revelou que não pretende voltar ao Brasil, pois está estabelecido na França e que retornar ao país onde nasceu seria reiniciar uma vida. “Espero encerrar minha carreira no Montpellier”, confessou.

Quando isso acontecer, a tendência é continuar no clube. Em mais uma oportunidade, o brasileiro manifestou a intenção de trabalhar na formação de novos atletas, mas, à rede de televisão francesa TF1, Hilton revelou que, mais adiante pode ser até treinador no MHSC.

Com 1,80m, Hilton é um gigante. A história que construiu, aliás, é gigante. Se adaptou rápido a França, cresceu no meio da paixão sangue e dourada do Lens, saiu da fila com o Marseille e calou muitas boca$ no Montpellier. Merece respeito e admiração por ser um dos zagueiros mais regulares do século XXI no futebol francês. Bicampeão, quatro vezes entre os melhores do país. Podemos repetir isso 400 vezes para valorizar um dos grandes brasileiros que trilhou os gramados gauleses.

Lyon e o “Fantasma de Bordeaux”

Lacazette e Grenier caçam fantasmas no Lyon

Lacazette e Grenier caçam fantasmas no Lyon

O mais otimista dos torcedores do Lyon não apostaria que seu time lutaria pelo título francês na temporada 2012/13. Os motivos estavam mais do que claros: orçamento baixo, desmanche do elenco e reformulação com jovens da base. Os resultados poderiam até vir, mas em temporadas seguintes.

Porém, a equipe comandada por Remi Garde surpreendeu e chegou a ficar oito rodadas na liderança do Campeonato Francês. Com Steed Malbranque e Bafétimbi Gomis brilhando e com jovens como Samuel Umtiti, Clément Grenier e Gueida Fofana despontando, estava ficando claro que o adversário direto do Paris Saint-Germain na luta pelo título nacional seria o Lyon e não o extremamente pragmático Marseille de Elie Baup.

O panorama mudou em 2013. O OL acumulou atuações ruins, sem ritmo e sem inspiração alguma, somando apenas 18 dos 39 pontos disputados no ano – o PSG somou 29 e o Marseille 20. Parte das atuações ruins pode ser depositada em Gomis, que parou de marcar gols e foi parar na reserva, e Malbranque, que começou a sentir o peso da falta da pré-temporada. O resultado disso tudo foi o afastamento do líder PSG, a ultrapassagem do Marseille e a perigosa aproximação de Saint-Étienne, Nice e Lille. Os Vérts, por exemplo, chegaram a ultrapassar o Lyon na 31ª rodada, jogando o OL para fora da zona de classificação da Liga dos Campeões, local onde estava hospedado desde a 2ª rodada. No último fim de semana, o Lyon retornou para as três primeiras colocações.

Os motivos disso tudo? Imaturidade do elenco, do técnico, escassez de jogadores, enfim, a história já retratou diversos exemplos semelhantes de times que atingem o topo com relativa pressa e começam a cair lentamente. Além disso, já surgem os burburinhos de problemas de relacionamento, outro fato recorrente nessas situações.

A vitória sobre o Toulouse no último fim de semana – primeira após três derrotas consecutivas – trouxe tranquilidade para o Estádio Gerland e deixou a sempre presente torcida mais confiante do potencial de sua equipe. Mas ainda há um temor: o fantasma do Bordeaux 2009/10.

Os Girondins eram os atuais campeões nacionais e, diferentemente do Lyon, entraram na Ligue 1 como favoritos ao título, o sétimo de sua história e segundo bicampeonato – o primeiro foi em 1983/84-1984/85. O ano de 2009 provou que este sonho não era impossível e o Bordeaux encerrou a primeira parte da temporada liderando o campeonato com oito pontos de vantagem para o vice-líder Marseille e como vencedor de sua chave na Liga dos Campeões, superando os poderosos Bayern e Juventus, além do inexpressivo Maccabi Tel-Aviv.

Laurent Blanc tinha o elenco em mãos e com Yoann Gourcuff e Marouane Chamakh em grandes momentos, o bicampeonato se tornava questão de tempo. Mas nesse mesmo momento da temporada em que o Lyon começa a tropeçar em suas próprias pernas na Ligue 1, o Bordeaux viu o sonho do bicampeonato ser jogado no lixo.

Na 28ª rodada, o empate sem gols com o Monaco jogou o Bordeaux para a segunda colocação e tirou a liderança de vez do time de Blanc, posição que ocupou por impressionantes 21 rodadas. Pior do que perder a ponta da tabela era ver que dois pontos o separavam do Lyon, sexto colocado.

Tropeço para o Lens iniciou o calvário do Bordeaux

Tropeço para o Lens iniciou o calvário do Bordeaux

Com um abril tenebroso, marcado pela eliminação nas quartas-de-final da Liga dos Campeões – justamente para o Lyon – e pela soma de um mísero ponto nos 18 disputados no Campeonato Francês, o Bordeaux se viu entre as cordas nas quatro rodadas decisivas de maio. Apesar de não perder os três primeiros duelos, a derrota diante do Lens na última rodada e a vitória do Montpellier sobre o PSG no Parque dos Príncipes proporcionou ao Bordeaux o duro gosto do nada. Nada de título, nada de Liga dos Campeões, nada de Liga Europa, nada de nada.

Laurent Blanc, que viria assumir a seleção francesa meses depois, largou os Girondins na mão de Jean Tigana aos pedaços, sem Gourcuff, sem Chamakh, sem torneios internacionais… Sem chão! Situação que permanece até hoje.

O objetivo maior de Remi Garde não é apenas recolocar o Lyon na Liga dos Campeões da Europa para reequilibrar as finanças e fazer com que o clube tenha mais capacidade de lutar pelo título nacional, mas também evitar que aconteça com seu time o que está acontecendo com o Bordeaux. Desde 2010, o tradicional clube está agonizando na Ligue 1, vivendo de lampejos e torcendo para que Francis Gillot consiga espremer o máximo de suor de um elenco enxuto, carente de talentos e que conta com a “sobra da sobra” do time campeão francês de 2008/09.

O elenco atual do Lyon não é vencedor, longe disso, mas o baque de ficar o campeonato todo sonhando com o título e ficar até sem a vaga na Liga Europa pode ser mais profundo em um grupo jovem como é o do OL do que foi em um minimamente vencedor, como era o do Bordeaux.

*Imagens: Getty Images

Acréscimos do jogo e da história

Grégory Wimbée foi o único goleiro a marcar no Campeonato Francês por 16 anos

O dia era 29 de novembro de 1996. Estávamos na 20ª rodada do Campeonato Francês e o estádio Marcel Picot ainda não tinha grama sintética. Nancy e Lens fariam um jogo obscuro da rodada. O time da Lorena era o vice-lanterna com 12 pontos e somente duas vitórias no campeonato. Enquanto a equipe sangue e ouro ocupava a 14ª colocação com 24 pontos. Além disso, Bordeaux e Metz, times que estavam empatados em pontos na parte de cima da tabela, iriam se enfrentar no mesmo horário.

Mas quem iria imaginar que seria o duelo dos times desesperados que entraria para a história? O 1×0 aplicado pelo Bordeaux pra cima do Metz só o ajudou na competição e acrescentou a história do confronto. O duelo entre Nancy x Lens também mexeu pouco com a história dos times durante o torneio, mas trouxe um novo fato ao futebol francês.

O Lens liderava o marcador, mesmo atuando fora de casa. Seu gol foi anotado por David Regis, aos 33 minutos do período complementar. O Nancy, incomodado com a preocupante situação, tratou de dar satisfação aos mais de 5 mil espectadores que foram ao Marcel Picot e partiu para cima do adversário. O desespero era tanto que, na última bola da partida, o goleiro Grégory Wimbée partiu para área e tentar o cabeceio.

Wimbée nasceu na região de Nancy e fazia duas temporadas que era titular na equipe. Mesmo tendo sido revelado pelo clube da cidade, só recebeu oportunidades em 1994, após convencer em seus dois anos no Charleville. Ele conquistou a titularidade do time logo após a saída do antigo camisa 1, Fabien Schneider.

Mas voltando ao jogo, Wimbée chegou na área em cima da hora. O escanteio já estava sendo cobrado, mas a bola, ainda assim, foi em sua direção. O zagueiro, posicionado há mais tempo, se antecipou e cortou, mas a bola parou nos pés de Sébastien Schemmel. O defensor do Nancy não pensou duas vezes e recolocou a pelota na área de primeira. Após toque de cabeça no segundo pau, a bola bateu no joelho de Wimbée e saiu de seu controle. Poderia faltar técnica, habilidade e inteligência e sobrar desespero e agonia. Aconteceu o contrário. Como um legítimo centro-avante, Wimbée girou e finalizou de pé direito. A bola desviou na marcação e tirou o goleiro Jean-Claude Nadon do lance, balançando as redes do Marcel Picot.

Um goleiro não deve ficar planejando comemorações ou dancinhas na hora do gol, a não ser que ele tenha como característica, bater faltas ou pênaltis. Até por isso, Wimbée saiu correndo feito um menino que fez um gol na sua aula de educação física na escola. Sua corrida foi meio sem direção e uma meia dúzia de companheiros o seguiu para comemorar.

A partida terminou 1×1, mas o futuro dos dois times não sofreu grandes alterações. O Nancy caiu, chegou a reagir, é verdade, mas levou desvantagem no saldo de gols do Caen. Já o Lens ficou em uma posição de conforto, 13º lugar.

Mas até hoje, aquele jogo é lembrado pelo gol de Wimbée, o primeiro de um goleiro na história do Campeonato Francês. Até mesmo o paraguaio José Luis Chilavert, que jogou no Strasbourg de 2000 a 2002, saiu zerado em gols – marcou na Copa da França, mas não na Liga.

De costas, Ahamada empatou a partida para o Toulouse

16 anos depois, finalmente um goleiro foi capaz de balançar as redes em um jogo do Campeonato Francês. A partida era Toulouse e Rennes e o TFC, assim como o Nancy, perdia em casa, só que por 2×1. O goleiro Ali Ahamada se aventurou na última bola do jogo e foi ao ataque. Após o levantamento na grande área, o goleiro conseguiu desviar de cabeça – e de costas!!! – pro fundo das redes.

Wimbée nunca foi um goleiro que enchesse os olhos, mas teve passagens boas por times como Lille, Metz e Grenoble, além do Nancy. Ahamada parece ter capacidade de chegar a patamares mais altos, mesmo tendo suas excentricidades. Suas saídas de gol são um tanto quanto esquisitas, sua reposição de bola não é das melhores e volta e meia, sofre uns apagões, como quando enfrentou o PSG e tomou um gol por cobertura de Pastore, onde estava muito adiantado. Ahamada já figura nas seleções de base da França e tem potencial para evoluir.

O gol do goleiro do Toulouse você já deve ter visto, a imagem rodou o planeta bola. Mas decidi colocar neste post, um vídeo capturado por um torcedor que se posicionou atrás do gol que Ahamada concluiu seu feito. Assista e entre na explosão da torcida!