A curva descendente de Martin

Lesões e baixo rendimento no Lille atrapalharam Martin | Foto: Reprodução

Meia clássico, de toque de bola refinado, com passes precisos de pé direito e movimentos que confundiam as mais rígidas marcações. Ao despontar no fim da última década com essas características, Marvin Martin era certeza de sucesso no Velho Continente para os anos seguintes.

Ao surgir como capitão do Sochaux durante a histórica conquista da Copa Gambardella de 2007 (tradicional torneio de base francês), o talentoso meia de 1,71cm demonstrava estar pronto para ingressar no time profissional, o que se comprovou na temporada 2008/09. Com apenas 20 anos na época, ajudou a equipe a escapar do rebaixamento com um gol e três assistências – duas delas no decisivo 2 a 1 sobre o Nantes, na penúltima rodada, quando deixou a zona de queda.

O tempo foi passando e ele foi evoluindo. Ao lado de Ryad Boudebouz, formou uma das mais atrevidas duplas do futebol francês no que trata de times de menor expressão. O entendimento dos dois era perfeito. Uniam velocidade, agilidade e rapidez de raciocínio. Eram apostas certas para clubes maiores.

Quase dez temporadas depois, tudo isso ficou para trás. Se Boudebouz ao menos teve passagens de destaque por Bastia e Montpellier, conseguindo agora a sonhada transferência internacional – defenderá o Real Bétis na Espanha – aquele outro menino talentoso, de estilo refinado, que chegou a estabelecer um recorde de 17 assistências – quebrado há duas temporadas por Dí Maria – não cumpriu metade das expectativas que foram criadas quando iniciou a carreira profissional e se encontra numa espiral de queda na carreira.

Ainda no Sochaux, chegou a alcançar a seleção francesa em 2011 e, logo na estreia, marcou dois gols na goleada por 4 a 1 sobre a Ucrânia em amistoso disputado em Donetsk (confira os gols no vídeo acima). Dias depois dessa triunfante estreia, veio o fardo que carrega até hoje: o jornal Le Parisien estampou em sua capa uma foto de Martin e a pergunta: é o novo Zidane?

Martin e o fardo carregado desde 2011 | Foto: Reprodução

A matéria, que pode ser conferida neste link, buscou semelhanças, como uma maluca equação relacionando as letras iniciais dos nomes dos dois (ZZ = MM), os dois gols em menos de cinco minutos no debute pela seleção e o fato de jogar com a camisa 10, que fora do próprio Zidane e de outras lendas, como Michel Platini e Raymond Kopa. Isso que não inclui os afagos elogiosos, como “prodígio” e “menino de ouro”, enfatizados na reportagem.

Só que como fora com Camel Meriem, Yoann Gourcuff e outros, a alcunha “novo Zidane” se tornou mais do que um fardo e alcançou o peso de maldição para Martin. Por mais que ele negue ter se vislumbrado com tal reconhecimento, é fato inegável que a carreira não decolou.

Durante a Eurocopa de 2012, foi anunciada a transferência para o Lille. Os Dogues ainda estavam em época de vacas gordas, com elenco caro e prestes a inaugurar novo estádio.

O sonho de se fixar como um dos principais jogadores da França e ser um dos 23 convocados para a Copa do Mundo de 2014 virou pesadelo e Martin viveu quatro temporadas de ostracismo, sem nenhum gol marcado, assistências escassas, um discreto empréstimo ao Dijon e várias contusões (inclusive, passou por duas duras cirurgias no joelho), que fizeram com que os Dogues se arrependessem amargamente dos € 10,5 milhões investidos em sua contratação – era a mais cara do clube até a chegada de Thiago Maia, por € 14 milhões.

Sobre seleção? Esquece, desde 2012 não é chamado e dificilmente vestirá a camisa azul de novo.

Martins assinou com o Reims por uma temporada | Foto: Twitter Stade de Reims

Por fim, o vínculo entre Martin e Lille foi amigavelmente encerrado na última semana e o meia, agora com 29 anos, vestirá a camisa do Stade de Reims na segunda divisão por uma temporada. Ao anunciar a nova contratação, o tradicional clube que imortalizou Raymond Kopa destacou no site oficial a “técnica e a experiência” do jogador, que espera fazer uma temporada completa sob todos os aspectos e recuperar o tempo que perdeu, se livrando da pesada maldição de ser mais um dos fracassados “novos Zidanes”.

Não está “nice”

Foto: Alexandre Debbache (OGC Nice Médias) & Serge Haouzi (Nice-Matin) - Bautheac e Pied lamentam as chances perdidas em Mônaco

Bautheac e Pied lamentam as chances perdidas em Mônaco

Grande surpresa da última temporada do Campeonato Francês, o Nice vai encerrando esta edição da competição com chances (pequenas, é verdade) de rebaixamento. Ao perder no domingo (20) para o Monaco, em partida válida pela 34ª rodada do torneio, as Águias ficaram na 15ª colocação com 39 pontos, seis acima do Sochaux, primeiro time dentro da zona de rebaixamento. Quando a 34ª jornada da temporada anterior foi encerrada, o Nice tinha 57 pontos, era o 6º colocado e estava somente três atrás do Lyon, sonhando com a impensável vaga na Liga dos Campeões (que se traduziu apenas em vaga na Liga Europa).

Muitos se questionam os motivos que levaram a esta queda de rendimento, principalmente porque a base do time foi mantida, assim como o experiente técnico Claude Puel. Analisando todas as nuances da temporada do Nice, levantei alguns pontos que podemos justificar como primordiais para esse notório declínio do time. Vamos a eles:

Lesões

A razão mais notada foi a série de lesões que assolou o time. Puel só conseguiu repetir a escalação uma vez durante todo campeonato (1-0 Guingamp e 0-1 Toulouse, 8ª e 9ª rodada). O treinador ainda foi obrigado a utilizar 27 jogadores durante a temporada.

Puel também se viu obrigado a aproveitar muitos atletas da base. Por mais que o Nice tenha uma reconhecida excelência na formação de jogadores, o número utilizado foi elevado e ocasionado pelas lesões. Foram 12 jogadores de 23 anos ou menos que atuaram nesta temporada pelas Águias, incluindo Mouez Hassen, 19 anos, Mohamed Said Benrahma, 18, Albert Rafetraniaina e Franck Honorat, ambos com 17.

O mais novo a entrar em campo foi um dos filhos do técnico: Paulin Puel, de apenas 16 anos. Isso foi na partida diante do Monaco. O detalhe é que Claude Puel já tinha o filho Gregoire (também jovem, de 22 anos) em campo, encerrando a partida, então, com as duas crias no time.

Devo ressaltar, também, que alguns dos sub-23 do elenco principal já são presenças constantes nos jogos, como são os casos de ‘Timo’ Kolodziejczak, 22 anos, e do meteoro Neal Maupay, 17.

Além da juventude do time, a dupla de zaga, que era um dos pontos fortes na última temporada, foi desmantelada. O argentino Renato Civelli se transferiu para o Bursaspor (Turquia) e Nemanja Pejcinovic não conseguiu manter o ritmo anterior. Em 2013/14, o sérvio fez apenas 14 jogos e participou de apenas uma partida em 2014, estando no estaleiro há mais de dois meses.

Para tentar tapar estes buracos, Puel fez diversas improvisações, como utilizar o lateral-esquerdo Kolodziejczak e o meio-campista Didier Digard na zaga. O remendo que mais está durando é a presença do também meio-campista Mathieu Bodmer entre os zagueiros. Aos 31 anos, o atleta é “macaco velho” no futebol francês e já desempenhou inúmeras funções pelos clubes que defendeu. Atuar no miolo de zaga foi apenas mais uma das posições que cumpriu com eficiência.

Pior ataque

Foto: Alexandre Debbache (OGC Nice Médias) & Serge Haouzi (Nice-Matin) - Cvitanich não marca há três meses

O argentino Dario Cvitanich não marca há três meses

Se a defesa sofreu por falta de peças, o ataque é ineficaz em função da queda de rendimento do principal atleta da posição. Hoje, o Nice tem o pior ataque do Campeonato Francês com apenas 29 gols marcados, média inferior a um por jogo. Neste mesmo estágio da temporada passada, as Águias haviam balançado as redes 51 vezes e tinham o 6º melhor ataque da competição ao lado do Montpellier (o Nice terminou com 57 tentos, o 5º mais positivo).

Parte dessa fraqueza ofensiva passa pela fraca temporada do atacante Dario Cvitanich. Depois de anotar 19 gols e ser o vice-artilheiro da temporada passada do Campeonato Francês, o argentino foi às redes somente oito vezes em 2013/14. Para piorar, o atleta de 29 anos fez somente um gol em 2014 e não marca há três meses (nove jogos).

E se na temporada passada Cvitanich teve como maior seca apenas três partidas, nesta o argentino já ficou sem marcar por sete jogos e, atualmente, nove. O nervosismo pela falta de gols do argentino é refletido no número de cartões. Já são oito cartões amarelos, dois há mais que toda temporada passada.

Troca de casa

Querendo ou não, o fato do Nice ter trocado de estádio nesta temporada fez diferença. O acanhado Stade du Ray, com capacidade para 18.696 pessoas, era um diferencial do time devido à pressão que a torcida exercia em cima dos adversários. O pequenino estádio deu espaço a moderna Allianz Riviera, palco da próxima Eurocopa, e capaz de receber mais de 35 mil pessoas.

A média de público subiu significativamente, é verdade. Em 2012/13, a média era de 10.246 (terceira pior) e na anterior de 9.207 (segunda pior). Nesta já é de 24.160 pessoas, sétima melhor média do campeonato.

O que pesa de forma contrária, entretanto, não é a presença de público, mas sim os resultados. Na 34ª rodada da temporada passada, o Nice havia vencido 11 dos 18 jogos realizados no Stade du Ray, tendo a segunda melhor campanha como mandante. Na atual temporada venceu nove de 17 e ainda tem o dobro de derrotas (seis contra três).

Péssimo visitante

Porém, se campanha na Allianz Riviera poderia lhe credenciar a um posto no meio da tabela, a atuação longe dela é lamentável. O Nice tem a terceira pior campanha como visitante, tendo perdido 11 jogos e vencido apenas dois de 17.

O mais impressionante ainda é o ataque. Lembra que falei que tinha o pior ataque com 29 gols? Pois é, oito desses 29 gols foram como visitante. OITO! É disparado o pior ataque entre os times que jogam fora de casa.

Na temporada passada, o Nice somou 26 pontos longe de casa, 20 até a atual rodada.

Tabela difícil

Na matemática, o Nice precisa somar sete pontos dos 12 que disputará para evitar o rebaixamento, mas, pela tabela, essa fuga deverá vir antes. O Sochaux, que é o primeiro time dentro da zona de rebaixamento, pega o Paris Saint-Germain no próximo dia 27. Uma (provável) derrota já diminui a nota de corte para 39, fazendo com que o Nice precise somar quatro pontos.

A tabela do Nice, apesar da mínima chance de queda, inspira cuidados. No próximo dia 26 recebe o Stade de Reims, equipe que classifico como uma das mais perigosas quando joga fora de casa. Tem a 8ª melhor campanha como visitante e assim já atrapalhou as vidas de Lyon, Marseille e Lille.

Logo em seguida, as Águias fazem dois confrontos diretos longe da Allianz Riviera. Pegam o Sochaux no dia 4 de maio e o Evian, em partida sem data confirmada. A participação será encerrada em casa diante do Lyon.

A chance de rebaixamento, volto a dizer, é minúscula, mas o Nice precisará curar alguns traumas, principalmente o de jogar fora de casa. Apesar de ser muito mais forte que os adversários diretos, não pode se acomodar na vantagem técnica, muito menos se apegar na tabela mais difícil dos rivais. A fórmula é simples: jogar futebol!

Crédito das imagens: Alexandre Debbache (OGC Nice Médias) & Serge Haouzi (Nice-Matin)

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Peço perdão pela demora em atualizar o blog. Tenho estado muito ocupado com o trabalho e a faculdade e nem sempre tenho aquela meia-hora marota pra começar a digitar alguma coisa. Sempre que possível tentarei trazer alguma coisa, isso eu garanto.

Le Podcast du Foot #50

Foto: PSG - Não foi desta vez que Ibrahimovic marcou

Foto: PSG – Não foi desta vez que Ibrahimovic marcou

O Campeonato Francês segue aberto. No duelo mais aguardado da temporada, Paris Saint-Germain e Monaco ficaram no empate por 1-1 e a distância entre os times permanece em cinco pontos, com os parisienses no topo da tabela.

>> Confira a classificação do Campeonato Francês;

Como não poderia deixar de ser, o confronto entre os líderes do campeonato foi o principal destaque de Le Podcast du Foot desta semana, que chegou a 50ª edição. Assim como nas semanas anteriores, a dupla Eduardo Madeira e Flávio Botelho foi responsável pelo andamento do programa, com as análises e opiniões a respeito do clássico.

O podcast também não deixou passar em branco as apresentações de Marseille, Lille e Lyon, que também foram marcantes na rodada.

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